Em 2012 o site do CTAv vem com algumas novidades! Uma delas é esse espaço onde, a cada mês, um profissional expert será convidado para uma entrevista sobre um tema da área em que é especialista, orientado por um pauteiro nosso. Essa proposta será voltada para que os  interessados na área de cinema possam conhecer mais sobre cada vertente, cada especificidade dos segmentos e sobre o próprio profissional que fala e, especialmente, gerar conteúdo web inédito sobre o cinema nacional.

Divulgação//

Como o primeiro entrevistado desse espaço, convidamos Antônio Moreno, ex-vice-presidente do Forcine – Fórum Brasileiro de Ensino de Cinema e Audiovisual (2003-2007) e professor Associado I do Departamento de Cinema e Vídeo da Universidade Federal Fluminense (1983-Atual), para discutir sobre o tema em que é especialista: A animação no Brasil. Confira a entrevista abaixo:

 

CTAV >>> Antônio, como você vê o ensino da Animação no Brasil? Ele é suficiente na relação oferta/demanda? Quais são as deficiências e potencialidades em nosso repasse de conhecimento?

AM – A situação é que existem poucos espaços na área de ensino público ou privado oferecendo ensino especializado, dirigido especificamente para a área de animação. Tanto na área teórica como na técnica ou prática. Some-se a dificuldade de se encontrar informações sobre os que possam existir. Vejo, uma vez por outra, cursos pagos oferecidos ensinando o uso de determinado software.  Por outro lado existem cursos em nível de especialização, como o oferecido pela PUC e outro, vez por outra, oferecido pelo SENAC de SP; disciplinas teóricas e práticas de animação oferecidas nos Cursos de Cinema da UFF e da USP; e o que penso ser o mais completo, dirigido a animação, que é o da Belas Artes da UFMG, que tem graduação e pós-graduação especificamente para a área.

A maioria dos animadores brasileiros termina tendo uma formação autodidata e fico impressionado com a capacidade de aprenderem sozinhos. Fiquei extasiado quando vi Vida Maria, do Márcio Ramos, 2006, e mais ainda ao constatar que o realizador fez o filme em 3D aprendendo sozinho a lidar com o software.

Quanta a relação oferta/demanda não existe nenhum levantamento que possa fornecer dados reais, o que dificulta uma resposta correta.

Quanto à deficiência e potencialidades no ensino, posso responder pelo que sinto lecionando na UFF. Veja, consegui, dentro do Curso de Cinema, com muita dificuldade montar um mini atelier de animação, com poucos computadores, mesinhas de luz para animação tradicional, e alguns softwares para realização de pequenos curtas nas disciplinas Animação e Oficina de Animação. Acontece que a necessidade que senti de atualizar os meios de produção em animação fica em segundo plano, pois o curso de cinema prioriza a produção de filmes ao vivo e as disciplinas relacionadas com este tipo de produção. E, embora tenha conseguido a contratação de mais um professor de animação, sinto ainda uma total falta de espaço, de locais onde se possa dedicar à pesquisa e atualização técnica. O que outra vez remete o animador, ou o estudioso ou pesquisador para o autodidatismo. Por fim, como tudo dentro das instituições de ensino sempre se materializa a partir de projetos de professores, tenho a firme idéia que somente com a implantação de um curso específico de animação proporcionaria uma devida expansão do ensino e concentração de artistas interessados na área. Mas isto é um projeto grande que requer contratação de pessoal, compra de equipamentos e uma batalha imensa para convencer os conselhos de ensino e pesquisa da necessidade e demanda por este tipo de curso.

 

CTAV >>> Em relação à evasão de talentos da animação brasileiros para o exterior, isso preocupa ou eleva o segmento?

AM – Ela não é tão acentuada assim para definir como evasão. Com certeza o fenômeno Carlos Saldanha marcou muito a cabeça das pessoas. Mas é um caso único, excepcional. Mas, quando acontece a ida de animadores para o exterior, vejo mais como uma busca por aperfeiçoamento, constância de trabalho e possibilidades de melhores salários. Um fenômeno brasileiro comum, inevitável.

 

CTAV >>>  O aumento do número de festivais nacionais que contemplam a animação, como categoria ou como tema central, dinamizou a produção de forma significativa?

AM – Sem dúvida, é inegável o que despertou o surgimento do Animamundi e do festival estudantil Animarte no aumento da produção e do interesse pela animação. O que derivou as possibilidades de existência de outros festivais dedicados ao gênero.

 

CTAV >>> Quais, a seu ver, são as animações brasileiras que um interessado na área não pode deixar de assistir e por quê?

AM – Caramba, são tantas que tenho medo de ser injusto esquecendo artistas. Vou citar só cinco longas e cinco curtas que se justificam por terem estilos diferentes, temas brasileiros, utilização de técnicas diversas, construção clara de roteiro, narrativa fluente e atenção esmerada com a trilha sonora e utilização de designer de som. Dos longas: Sinfonia Amazônica, 1953, do Anélio Lattini Filho, que aguarda restauração; Piconzé, 1972, do Yppe Nakashima, que espero um dia ser recuperado, é a cores; Boi Aruá, 1983, do Chico Liberato; O Grilo Feliz, 2001, do Walbercy Ribas Camargo; Brichos, 2006, do Paulo Munhoz. E dos curtas: Batuque, do Stil; Almas em Chamas, do Arnaldo Galvão; Campo Branco do Telmo Carvalho; Yansan, do Carlos Eduardo Nogueira; e Vida Maria, do Márcio Ramos.

 

CTAV >>> Como está o mercado de trabalho na área da animação? O que você acredita que precise para que a animação no Brasil continue em crescimento e ganhando mais força no cenário do cinema nacional e internacional?

AM – Primeiro, nunca tivemos a tradição de estúdios de produção de audiovisual, muito menos de animação. A classe cinematográfica vive de editais sejam estatais, sejam de empresas, essa é a realidade. E os editais específicos para animação foram criados muito pela intervenção da ABCA, ampliando as possibilidades de produção. Mas percebo ainda nestes editais a visão parcial do percurso de uma produção de um audiovisual. Ele não se realiza somente com a sua produção, com sua materialização em produto audiovisual. Isso tanto para filmes ao vivo como de animação. Falta a visão do todo, ou seja, as fases seguintes de: possibilidades de licenciamento de produtos advindos da obra, a divulgação, publicidade e propaganda, distribuição e finalmente o canal de exibição em cinemas ou outras mídias. Essa fase importantíssima não é contemplada ou pensada nos editais. E esse é ponto a ser repensado nos editais. E então o que se vê: absurdos como longas de animação, de qualidade, serem lançados, no Rio de Janeiro, num só cinema durante uma semana. Enquanto que, os curtas seguem os caminhos já tradicionais como festivais e circuitos alternativos e em dois anos desaparecem.

Este cenário nos leva a refletir que os estúdios de animação que existem podem ser vistos como de dois tipos: os de atividade temporária, pois só têm atividade plena quando ganham um edital para a produção. Acabado os meses de produção, a maioria dos técnicos são dispensados ou colocados de stand-by, situação que nos reporta muito ao que comentei anteriormente; e os duradouros, que devem muito a atividade plena pela produção de comerciais, trabalhos para a televisão ou, mais recentemente com as possibilidades de acordos de co-produção internacional para mini-série brasileira tendo, por lógica, como ponta da co-produção, um canal de televisão para escoamento, para a exibição e exploração comercial da série. O que é, sem dúvida, uma demonstração de funcionalidade e avanço de visão do percurso da obra audiovisual. (Antônio Moreno.Dez/2011-Jan/2012).

____

Entrevista por Carolina Balo

Para conhecer mais sobre Antônio Moreno você pode acessar seu Curriculum Vitae na Plataforma Lattes aqui.